Histórias de Ipanema

Aplausos ao pôr do sol em Ipanema: como surgiu?

O GLOBO (por Julia Alvim)

Era um dia de semana de verão em 1968 ou 1969, ninguém se recorda ao certo. A Praia de Ipanema estava cheia, não tinha uma nuvem no céu, o sol caía por trás das Ilhas Tijucas e, da areia, entre as ruas Farme de Amoedo e a antiga Montenegro, hoje Vinicius de Moraes (essa história será contada na continuação desta reportagem), uma voz gritou: — Pessoal, vamos bater palma. Depois de um dia desses, só agradecendo.

A galera não pensou duas vezes. Clap! Clap! Clap! Nascia ali uma tradição de Ipanema, aprovada por uns e tida como besteira por outros poucos. Mas que perdura até os dias de hoje: bater palma para o pôr do sol.

A voz era do jornalista Carlos Leonam, figurinha fácil naquele point. Morador do bairro da década de 1960 até 2009, ele frequentava a praia no mesmo lugar que a galera de “O Pasquim” — Glauber Rocha, Ziraldo, Jaguar e Jô Soares, que sempre chegava de moto. Perto dali, bem em frente à Farme, ficava a turma de Gal Costa, os artistas e músicos, que também embarcaram na onda dos aplausos. Era uma época efervescente, nas palavras do próprio Leonam.

Apesar de já não viver em Ipanema (atualmente mora no Humaitá), e de não frequentar mais a praia — desde 1975, quando construiu uma casa em Paraty Mirim, reduziu suas idas — , o jornalista guarda memórias vivas e um carinho grande pelo bairro. É saudoso ao lembrar dos tempos em que trabalhava na editora Nova Fronteira e, religiosamente, passava sua hora (ou horas) de almoço nas areias da praia. Comia dois cachorros-quentes Geneal, uma das únicas opções de alimentação por ali na época.

— A praia já não é a mesma. Vende-se até sushi. Para mim, a única coisa boa de hoje é o Beduíno, com a esfirra e o quibe. Antigamente, só tinha o Geneal na calçada, e todo mundo almoçava ali. E o limãozinho e o mate. Tinha também o botequim Mau Cheiro, onde o pessoal ia para comer croquetes. Eu me lembro que era diretor da Nova Fronteira; chegava a hora do almoço, eu colocava o meu calção e ia para a praia — recorda Leonam, prestes a completar 80 anos.

Nome de rua no currículo

Carlos Leonam tem é história de Ipanema. Algumas são lembradas em seu livro “Os degraus de Ipanema”, de 1997, como o momento da criação do termo “esquerda festiva”. Na capítulo “A primavera de Ipanema” tem um texto original de Jaguar, que faz referência à expressão. Numa nota de rodapé, Leonam conta que Jaguar confundiu-se e que foi Zunir Ventura quem lembrou bem a origem do termo. Foi inventado numa festa do antigo Bar do Bem, na década de 1960, quando o então ministro San Thiago Dantas decidiu que haveria duas esquerdas: a positiva e a negativa. Leonam, que estava dançando, correu para a mesa, onde também estava Ziraldo, e disse que tinha outra esquerda. Era a esquerda festiva.

 Também foi Leonam quem sugeriu trocar o nome da antiga Rua Montenegro para Vinicius de Moraes. Logo após a morte do poeta, em julho de 1980, ele deu a ideia ao amigo Rubem Fonseca, na época diretor da Fundação Rio. Fonseca levou a sugestão ao prefeito, Julio Coutinho, que aceitou. Mas houve quem criticasse a mudança.

— Eu achava que algum vereador ia querer colocar o nome de Vinicius em alguma gleba lá no Recreio. Liguei logo para o Rubem, que consultou as bases, que na época eram Sergio Cabral, pai, e Albino Pinheiro, fundadores da Banda de Ipanema, que acharam ótimo. Tinha que ser aquela rua, do Veloso (bar). Algumas pessoas não gostaram. Mas eu disse que a mudança não era para nossa geração, era para as próximas — lembra Leonam.

Ele estava certo.

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